UFMS: Laboratório do olavismo nunca mais (?)

Editorial | Universidade decide em maio se mantém grupo que aderiu a projetos bolsonaristas na educação

Ao contrário dos delírios da extrema-direita, as universidades públicas do Brasil estão longe de ser espaços dominados por ideologias de esquerda. Quando se trata de um estado com grande influência bolsonarista, como Mato Grosso do Sul, isso fica ainda mais evidente. Neoliberalismo, conservadorismo e arbitrariedade compõem o cenário da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).

A UFMS foi, por exemplo, a única que se propôs a aderir ao Future-se, projeto do então ministro da Educação de Jair Bolsonaro, o infame Abraham Weintraub. A proposta, que não foi implementada, consistia em manter a educação superior pública a partir de investimentos privados. O Future-se, apelidado de “Fatura-se”, foi anunciado logo após um corte sem precedentes nos recursos das universidades.

Era evidente que, se implementado, o Future-se representaria uma ameaça a milhares de cursos e projetos de pesquisa em todo o Brasil, já que apenas o que fosse considerado lucrativo seria apoiado por empresas privadas. A lógica do lucro não opera no mesmo tempo que a pesquisa acadêmica exige, nem nos mesmos objetivos que a ciência enquanto bem público deve buscar. Assim, no final do ano de 2019 estudantes realizaram a ocupação do Bloco VI, onde operavam, à época, cursos como Ciências Sociais, Psicologia, Jornalismo, Filosofia e História.

A reação da reitoria da UFMS, durante a primeira gestão do atual reitor Marcelo Turine, foi acionar a Polícia Federal contra alunos que se encontravam no local. 61 pessoas foram intimadas. Além disso, houve um corte na energia elétrica do bloco, que dificultou as condições diante da falta de luz, internet, água gelada e ventilador, lembrando que Campo Grande frequentemente chega a sensações térmicas superiores a 40ºC. Uma roda de capoeira chegou a ser realizada à luz de velas. Os acadêmicos só conseguiram mantimentos básicos graças a doações solidárias de professores.

Em 2020, a Reitoria convidou o criacionista Marcos Eberlin para palestrar na abertura do evento “Integra UFMS” – e o pior: ele aceitou. Eberlin utilizou do espaço para atacar a teoria da evolução e evocar senso-comum de cunho religioso, o que gerou protestos de pesquisadores.

Já em 2021, a gestão Turine disponibilizou a UFMS para servir como cobaia da implementação do programa “Famílias Fortes”, da então ministra da Família e Direitos Humanos, a fundamentalista evangélica Damares Alves. O projeto, que se apresenta com o objetivo de “fortalecer famílias”, tem como metas “evitar comportamentos de risco” e “a iniciação sexual precoce”, embora não especifique os termos. A Universidade passou a servir como local dos “cursos para famílias”.

No lançamento do programa, ocorrido na UFMS, o discurso foi de “resgate dos valores tradicionais”. O deputado federal bolsonarista Luiz Ovando (PP-MS) afirmou que o “único modelo digno de família” é o “instituído na Bíblia, em Gênesis”. O “Famílias Fortes” considera, portanto, um único modelo de família como válido e é a ele que busca fortalecer. Caso fosse política interna de uma igreja, haveria liberdade para tal. No entanto, ele se deu como política governamental e utilizou-se dos espaços de uma universidade pública, portanto laica pela Constituição.

Também houve, no mesmo ano, o desembolso de 51,2 mil reais para contratação, sem licitação, do coach Karim Khoury para palestra sobre suicídio. Khoury não possui sequer formação nas áreas de psicologia ou psiquiatria e utiliza uma abordagem ultrapassada, como dizer às pessoas para “lutar contra as vozes de suas cabeças”.

No mesmo ano de 2021, ainda sob a pandemia da Covid-19, a reitoria planejou o retorno às aulas em regime híbrido, o que gerou reações entre servidores e estudantes. Em 2022, com a volta às aulas presenciais, a UFMS recusou o “passaporte da vacina”, ou seja, condicionar a possibilidade de retorno à comprovação de vacinação.

O projeto neoliberal e de contornos reacionários representado pela atual gestão da UFMS é representado, nas eleições para a reitoria que ocorrem em maio, pela atual vice-reitora Camila Ítavo, que concorre à vaga de reitora tendo Albert Schiaveto como vice. Ela ainda conta com uma linha auxiliar, o professor Ruy Corrêa Filho, cuja vice é Luciana Contrera. Contra a política vigente, o professor Marco Aurélio Stefanes, ex-presidente da Seção Sindical dos Docentes da UFMS (Adufms), também apresentou sua candidatura, tendo como vice a professora Ana Denise Maldonado. 

Mais do que o lançamento de um nome, a chapa de oposição representa um grupo político, que esteve à frente de movimentos como Vacina Já, da defesa do protocolo vacinal e da mobilização pela revogação da nova Base Nacional Comum Curricular – que, entre outras medidas, unificou a formação de professores de licenciatura na mesma matriz curricular, que não leva em conta as especificidades de cada instituição e localidade.

Diante da realidade que se apresenta, a Badaró enxerga a necessidade de posicionamento, enquanto veículo fundado por estudantes da UFMS em 2019, no contexto da mobilização contra o Future-se e os cortes na educação. Sendo assim, a Badaró declara seu apoio à chapa “UFMS em Movimento”, formada pelos professores Marco Aurélio Stefanes e Ana Denise Maldonado, e convida a comunidade acadêmica a exercer seu direito de voto no dia 10 de maio.

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