Por dentro dos principais grupos armados de países islâmicos

Quem são e o que defendem os principais movimentos armados que atuam em países de maioria muçulmana? Preparamos uma lista sobre os 13 mais proeminentes

Por Norberto Liberator
Colaboraram Fábio Faria, Leopoldo Neto e Marina Duarte

Acontecimentos das últimas semanas reacenderam o debate sobre movimentos militantes que atuam em países de maioria muçulmana. Na terça-feira passada (12), Israel bombardeou Gaza e matou 34 pessoas, entre elas Baha Abu Al-Ata, líder militar da organização Jihad Islâmica. O grupo revidou com disparos de foguetes. Foi anunciado um cessar-fogo na quinta-feira (14), mas Israel voltou a atacar no sábado (16), desta vez contra alvos do Hamas.

 No último dia 26, foi anunciada a morte do líder do autoproclamado Estado Islâmico do Iraque e da Síria (Daesh)*, Abu Bakr Awad “Al-Baghdadi”. Dois dias depois, o porta-voz do grupo, Abu Al-Hassan Al-Muhajir, também foi morto. No dia 5, a irmã de Al-Baghdadi, Rasmiya Awad, foi presa.

Das mesas de bar ao Congresso Nacional, o tema é envolto em confusão, preconceito e ignorância. O deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), por exemplo, afirmou que o Daesh é um grupo de “extrema-esquerda”, embora o movimento siga a ideologia ultraconservadora e anticomunista do wahabismo – a mesma que baseia as leis da Arábia Saudita, país aliado de potências ocidentais e recente parceiro-chave de Jair Bolsonaro.

No ano passado, a senadora Ana Amélia Lemos (PP-RS) relacionou a rede de televisão catariana Al-Jazeera ao Daesh, ao criticar uma entrevista de sua colega Gleisi Hoffmann (PT-PR) à emissora. A fala da parlamentar de extrema-direita foi repudiada pelo Instituto da Cultura Árabe no Brasil (Icárabe).

Bolsonaro, por sua vez, já relacionou o termo “xiita” ao que considera “radicalismo”, embora não haja necessariamente tal ligação. A principal diferença entre as duas maiores vertentes muçulmanas é que os xiitas consideram Ali, genro do Profeta Mohammed (“Maomé”), como seu sucessor e guardião de seus preceitos; enquanto os sunitas seguem, além do Alcorão, outro livro –  Sunna –, que traz ensinamentos de Mohammed, de Ali e de três chefes islâmicos posteriores, não reconhecidos pelos xiitas.

Entre os grupos armados há sunitas, xiitas, laicos e membros de minorias religiosas – assim como, politicamente, há desde socialistas a extremistas de direita. Para debater o assunto, preparamos uma lista sobre as 13 principais organizações militantes da vasta faixa de terra que engloba o Oriente Médio, países norte-africanos e parte da África subsaariana. 

Fatah

O “Movimento pela Autonomia da Palestina” é uma entidade que surgiu em 1950, de inspiração social-democrata, e luta pela criação de um Estado palestino laico. Para evitar a sigla literal em árabe, que seria “Hataf” (“morte”, em português), os fundadores Khalil Al-Wazir e Yasser Arafat optaram por utilizar o anagrama “Fatah”, que significa “recomeço”. 

Em 1964, foi criada a Organização pela Libertação da Palestina (OLP), coligação formada por grupos laicos em torno do ideal de independência. O Fatah passou a integrá-la e Arafat foi eleito para presidir a entidade. 10 anos depois, a OLP passou a ser representante legítima do povo palestino na Organização das Nações Unidas (ONU).

Em 1988, Khalil Al-Wazir foi assassinado por membros do serviço secreto israelense (“Instituto de Inteligência e Operações Especiais” – Mossad), na Tunísia. No mesmo ano, o Conselho Nacional Palestino – entidade parlamentar ligada à OLP – aprovou uma declaração de independência e Arafat reconheceu o direito à existência do Estado de Israel.

Em 1993, iniciaram-se os Acordos de Oslo, que visavam negociar a paz entre Israel e Palestina. Arafat representou os interesses palestinos durante o processo. O primeiro-ministro Yitzhak Rabin e o chanceler Shimon Peres lideraram a conciliação pelo lado israelense. Os três receberam o Prêmio Nobel da Paz em 1994.

Na ocasião, foi fundada a Autoridade Nacional Palestina, espécie de estágio transitório para a criação do Estado nacional. Arafat foi eleito presidente e permaneceu no cargo até sua morte em 2004, quando foi substituído por Mahmoud Abbas – também membro do Fatah. 

Jihad Islâmica

Fundado em 1979, o “Movimento da Jihad Islâmica da Palestina” (o termo “jihad” significa “guerra santa” em árabe) prega a criação de um Estado teocrático muçulmano e, ao contrário de seus rivais Fatah e Hamas, não participa de eleições. Sua atuação ocorre por meio de atentados a bomba – muitos deles suicidas – e ações militares armadas. O grupo possui financiamento iraniano

A Jihad Islâmica foi fundada por intelectuais ultraconservadores e liderada pelo físico, matemático e médico Fathi Shaqaqi, de sua fundação até 1995 – quando ele foi morto por agentes do Mossad em Malta. O posto de representante oficial da entidade passou ao economista Ramadan Shalah, que chegou a ser professor-adjunto na Universidade do Sul da Flórida. 

O líder espiritual da organização é Abd Al Aziz Awda, graduado em Estudos Árabes na Universidade do Cairo, ex-professor universitário e um dos 10 principais procurados do Departamento Federal de Investigações dos Estados Unidos (FBI). 

O professor palestino Khalil Shikaki, diretor do Centro Palestino para Pesquisa Política, afirma que a Jihad Islâmica “sempre foi elitista” e nunca teve apoio massivo da população, sendo mais ligada a jovens universitários. 

Hamas

O “Movimento de Resistência Islâmica” (“Hamas” na sigla árabe, que também significa “fervor”) defende a criação de um Estado palestino teocrático e sunita. O grupo pratica ações armadas, controla escolas e hospitais, e desde 2006 atua como partido político. 

O Hamas foi fundado em 1987, na primeira Intifada – nome dado às rebeliões populares contra a ocupação israelense. Suas ações incluíam atentados suicidas, carros-bomba e enfrentamentos armados. Em 1989, seu líder espiritual Ahmed Yassin foi preso e condenado à prisão perpétua pela Justiça israelense, mas solto em 1997 após um acordo de troca de prisioneiros com a Jordânia. Ele foi morto durante um ataque de Israel em 2004.

Em 2006, o grupo venceu as eleições parlamentares palestinas e seu líder Ismail Haniyeh tornou-se primeiro-ministro. Em 2007, o presidente Mahmoud Abbas demitiu Haniyeh e nomeou Salam Fayyad para o cargo. O Hamas não aceitou a decisão. A Palestina passou a ter dois governos – de Fayyad na Cisjordânia e Jerusalém Oriental; e de Haniyeh na Faixa de Gaza. Nas eleições de 2014, o grupo reconheceu a derrota eleitoral para o Fatah e formou-se um governo unificado.

Em 2017, em carta aberta, o movimento passou a aceitar a divisão de fronteiras entre Palestina e Israel, estabelecida pela ONU em 1967. Com a ação, o Hamas deixou de defender a destruição do Estado judaico. 

Hezbollah

Surgido no Líbano, o “Partido de Deus” (“Hezbo Allah”, mais conhecido pela junção “Hezbollah”) é um grupo de inspiração xiita, que defende a implantação de um regime islâmico nos moldes do Irã. Sua fundação ocorreu em 1982, durante a ocupação israelense. 

O grupo ocupa militarmente uma faixa de terra no sul do Líbano, próxima à fronteira com Israel, onde controla escolas, hospitais e cooperativas agrícolas, além de disputar as eleições libanesas. Seu líder é Sayyid Hassan Nasrallah, no posto desde 1992, quando o fundador Abbas Al-Musawi foi morto em uma ofensiva das Forças Armadas israelenses.

Em 2006, o Hezbollah e o Exército de Israel travaram uma guerra entre os meses de julho e agosto, que acabou após um cessar-fogo mediado pela ONU – a “Resolução 1701”. De acordo com o livro “34 Dias”, dos jornalistas Amos Harel e Avi Issacharoff, cerca de 1.200 libaneses e 165 israelenses morreram no conflito.

Em setembro deste ano, após drones de Israel serem lançados ao centro de mídia do Partido, o Hezbollah respondeu com mísseis antitanque contra postos militares israelenses. Israel voltou a atacar, lançando foguetes ao sul do Líbano. Não houve mortos na troca de ataques e ambos recuaram. 

Talibã

O grupo fundamentalista “Taliban” ou “Talibã” (“Estudantes”, no idioma pachtun) surgiu em 1994, como uma milícia de mujahedins (“combatentes santos”, em árabe), guerrilheiros islâmicos que recebiam treinamento e suporte estadunidense. A maioria dos militantes talibãs é de origem pachtun, uma das dezenas de etnias que habitam o Afeganistão.

O fundador do grupo, Mohammed Omar – mais conhecido como Mullah Omar –, foi treinado militarmente pela Agência Central de Inteligência dos Estados Unidos (CIA) durante a guerra civil que opôs mujahedins e comunistas, entre 1979 e 1989. Desde a chamada Revolução de Saur, em 1978, o Afeganistão era governado pelos comunistas, que tinham apoio soviético. 

Em 1986, os soviéticos substituíram o presidente Babrak Karmal por Mohammad Najibullah, que propôs um acordo de paz com os mujahedins, mas foi deposto em 1992 por alas que não aceitavam a negociação. No poder, os mujahedins se dividiram e travaram guerra entre si.

A milícia Talibã avançou até tomar a capital Cabul e declarar Mullah Omar como chefe de Estado, em 1996. Najibullah, que estava exilado em uma sede da ONU, foi capturado, castrado e enforcado em praça pública. Proibiu-se o uso de televisões, roupas ocidentais e barbas raspadas. As mulheres foram obrigadas a cobrir todo o corpo, inclusive o rosto.

Apesar do extremismo na política interna, o regime Talibã manteve relações diplomáticas com os Estados Unidos. Em 1998, o governo de Bill Clinton atacou com mísseis um campo da Al Qaeda em território afegão, após atentados a bomba nas embaixadas estadunidenses da Tanzânia e da Nigéria. Na ocasião, Omar ligou para a Casa Branca para pedir o fim das ofensivas – e teve o pedido atendido.

A cordialidade acabou em 2001, quando Omar foi acusado pelo presidente George W. Bush de dar asilo a Osama Bin Laden, que reivindicou os atentados ao World Trade Center e ao Pentágono no dia 11 de setembro. Iniciaram-se bombardeios ao Afeganistão. Os talibãs foram derrubados e substituídos por um governo pró-Bush.

Omar morreu em 2013 por tuberculose. O Talibã continua ativo, praticando atentados suicidas e ataques armados. O sustento do grupo vem principalmente do comércio da papoula, matéria-prima da heroína e do ópio.  

Irmandade Muçulmana

Fundada em 1928 pelo religioso de extrema-direita Hassan Al-Banna, a “Irmandade Muçulmana” tem sede no Egito, mas possui focos de atuação em vários países, como Argélia, Somália, Sudão e Líbia.

O movimento defende uma interpretação extremista do Alcorão e foi criado para combater o colonialismo britânico. Posteriormente, passou a pregar a expansão islâmica em escala global. Em 1954, a Irmandade Muçulmana foi acusada de tentar assassinar Gamal Abdel Nasser, presidente egípcio de esquerda. Em resposta, Nasser proibiu a atuação do grupo.

A organização voltou a atuar legalmente durante o mandato de Anwar Al-Sadat. Em 1971, Sadat declarou anistia à Irmandade Muçulmana, mas em 1981 foi morto em um atentado praticado por membros do grupo, que não aceitaram o acordo de paz firmado em 1979 entre o governo egípcio e Israel.

Atualmente, as principais ações da Irmandade são atentados a bomba e disputas armadas por territórios. Em 2011, foi uma das principais organizações a liderar protestos que culminaram na destituição do ditador Hosni Mubarak, durante a chamada “Primavera Árabe”. Após a queda de Mubarak, foram realizadas eleições que deram vitória a Mohammed Mursi, líder da Irmandade Muçulmana.

Mursi governou até 2013, quando foi derrubado por um golpe militar. Ele faleceu este ano, após desmaiar em uma audiência no Cairo, durante processo em que era acusado de incentivar atos terroristas e assassinatos. O grupo deixou de atuar como partido político em 2014, quando foi banido pelo governo de Abdel Al-Sisi. 

Al Qaeda

Responsável pelos atentados que mataram 2.996 pessoas no dia 11 de setembro de 2001, a “Al Qaeda” (“A Base”, em árabe) foi fundada entre 1988 e 1989, pelo economista saudita Osama Bin Laden e pelo jurista palestino Abdullah Azzam, na cidade paquistanesa de Peshawar, próxima à fronteira com o Afeganistão. 

Bin Laden era um radical sunita de família bilionária e já financiava a luta anticomunista dos mujahedins, por meio do “Fundo de Serviços Afegãos” (MAK, na sigla em árabe). No entanto, seu objetivo não era apenas o controle político do Afeganistão – e sim praticar a jihad a nível global. Ele passou a ser o único líder da Al Qaeda em 1989, com a morte de Azzam.

O governo do republicano Ronald Reagan e de seu vice George Bush (pai) foi forte aliado da Al Qaeda na guerra civil contra os comunistas. O jornalista Hazhir Teimourian, especialista em política do Oriente Médio, afirmou em entrevista à rede BBC que Bin Laden foi financiado e treinado pela CIA na época. 

Em 1991, o líder da Al Qaeda expandiu sua rede de atuação para o Sudão, a convite do extremista Hassan Al-Turabi. Dois anos depois, o repórter Robert Fisk o entrevistou a serviço do jornal britânico The Independent. A chamada da matéria afirmava que Bin Laden “pôs seu exército na estrada pela paz”. Em 1998, as embaixadas dos Estados Unidos na Tanzânia e no Quênia foram alvos de atentados reivindicados pela Al Qaeda.

Em 2001, os ataques ao World Trade Center e ao Pentágono fizeram Osama Bin Laden se tornar a pessoa mais procurada do planeta. O presidente George W. Bush – filho de George Bush – iniciou ataques ao Afeganistão, que culminaram na derrubada do regime Talibã. Em 2011, Bin Laden foi encontrado e morto. A chefia do grupo passou a seu médico particular, o egípcio Ayman Al-Zawahiri. 

Daesh (Isis)*

O autoproclamado “Estado Islâmico do Iraque e da Síria” (“Daesh”, na sigla em árabe – ler nota de rodapé) tem como base ideológica o wahabismo, vertente sunita extremista que considera “infiéis” todos – inclusive muçulmanos sunitas – que não a seguem. A doutrina também baseia a legislação da Arábia Saudita.

O Daesh foi fundado pelo jordaniano Abu Musab Al-Zarqawi, que chefiou o grupo Bayat Al-Imam (“Lealdade ao Sacerdote”, em árabe) em seu país – o que o levou à prisão de 1993 a 1999. Solto, mudou-se para o Afeganistão, onde comandou a Organização pelo Monoteísmo e Guerra Santa (STWJ, na sigla árabe).

Em 2002, Zarqawi chegou ao Iraque. Um ano depois, os Estados Unidos iniciaram ataques contra o regime de Saddam Hussein. Em 2004, o jordaniano jurou lealdade a Osama Bin Laden e passou a chamar seu movimento de Al Qaeda no Iraque (AQI). Dois anos mais tarde, Zarqawi foi morto em um bombardeio e substituído por Abu Ayyub Al-Masri, que mudou o nome do grupo para Estado Islâmico no Iraque.

Masri aproveitou a desestabilização para conquistar territórios, com o objetivo de estabelecer um “califado”. Suas tropas avançaram sobre o norte do Iraque. Em 2010, ele foi morto e o poder passou a Abu Bakr Awad, conhecido como Al-Baghdadi.

Sob liderança de Al-Baghdadi, o grupo rompeu com a Al Qaeda, ampliou sua área de ocupação e mudou o nome para Estado Islâmico do Iraque e do Levante. Com o envolvimento dos Estados Unidos no conflito sírio em 2012, apoiando grupos opositores ao regime de Bashar Al-Assad, Al-Baghdadi se utilizou da instabilidade para expandir seus domínios.

Em 2014, a organização passou a se chamar Estado Islâmico do Iraque e da Síria, conhecido pejorativamente como Daesh. Al-Baghdadi prosseguiu sua política expansionista e proclamou o início do “califado”, passando a usar a alcunha de “Califa Ibrahim”. 

O Daesh começou a recrutar militantes do mundo todo por meio de redes sociais – para atuar na guerra ou para praticar atentados em qualquer país.  O “califado” chegou a ocupar uma área de 88 mil km² com cerca de oito milhões de habitantes, onde impôs leis parecidas com as do Talibã e começou a pôr em prática o genocídio de minorias como os yazidis – fração do povo curdo que segue uma religião de base zoroastrista.

Os ataques mais proeminentes de terroristas que juraram lealdade ao Daesh foram à redação do jornal Charlie Hebdo, com 17 mortos, e atentados coordenados em diversos pontos de Paris, com 130 vítimas fatais, ambos em 2015 – mesmo ano em que o grupo passou a controlar Palmira, cidade histórica tida como patrimônio da humanidade, e destruiu obras de milhares de anos.

Ainda em 2015, forças curdas expulsaram o Daesh da cidade síria de Kobane; no Iraque, o Exército curdo tomou Sinjar, então em poder do grupo. Em março deste ano, foi anunciada a “total eliminação do chamado califado”. No último dia 26, Al-Baghdadi foi morto durante ofensiva estadunidense. 

Boko Haram

O autodenominado “Estado Islâmico da África Ocidental”, mais conhecido como Boko Haram (no dialeto hauçá, “a educação ocidental é um pecado”) foi fundado em 2002 pelo religioso fundamentalista Mohammed Yusuf, na cidade nigeriana de Maiduguri, capital do estado de Borno. 

O grupo defende um Estado baseado em interpretações extremistas da Sharia, a Lei Islâmica. Em dezembro de 2003, ocorreu a primeira ação conhecida da organização, quando cerca de 200 militantes atacaram postos policiais próximos à fronteira com o Níger. Em 2009, Yusuf foi capturado pela polícia nigeriana, que o exibiu à imprensa e o matou em seguida. O Boko Haram passou a ser comandado por Abubakar Shekau.

Em 2014, o grupo invadiu uma escola na cidade de Chibok e sequestrou 276 garotas adolescentes que se preparavam para uma prova. Shekau gravou um vídeo em que prometeu vender as meninas. No ano seguinte, um atentado do Boko Haram em Baga deixou cerca de dois mil mortos, de acordo com a Anistia Internacional. Ainda em 2015, Shekau jurou lealdade ao Daesh.

Em maio de 2017, o Boko Haram soltou 82 meninas após acordo com o governo da Nigéria, que se comprometeu a liberar militantes do grupo que estavam presos. Em janeiro de 2018, o movimento invadiu outra escola, em uma vila do estado de Yobe, e sequestrou 110 garotas, das quais 101 foram devolvidas em março. Estima-se que a “guerra santa” do Boko Haram tenha matado mais de 30 mil pessoas. 

Tahrir Al-Sham (HTS)

A “Organização pela Libertação do Levante” (“Hayat Tahrir Al-Sham” ou “HTS”, em árabe) surgiu da fusão entre a Frente Al-Nusra (“Jabath Al-Nusra”, que significa “Frente da Vitória”) e grupos menos expressivos. Seu líder militar é o jihadista Abu Mohammad Al-Julani e o guia espiritual é Abu Jaber Shayk. O objetivo do movimento é estabelecer uma teocracia sunita na Síria.

A HTS é considerada o grupo jihadista mais poderoso a ainda controlar territórios sírios. Sua história começa com a Frente Al-Nusra, criada em 2012. Pouco após fundar esta organização, Mohammad Al-Julani declarou lealdade à Al Qaeda. Por isto, a Al-Nusra também era chamada de “Al Qaeda na Síria”. Os dois grupos romperam em 2016.

Em 2017, Julani se uniu à Frente Ansar Al-Din (“Apoiadores da Religião”), a setores do Exército da Conquista e a outros movimentos, para a criação de uma aliança sunita contra o regime de Bashar Al-Assad. Surgia a HTS, cuja atuação se concentrou em Idlib, província na região noroeste da Síria – fronteira com a Turquia.

Atualmente, a HTS ocupa parte do território de Idlib, onde trava batalhas contra o governo de Assad e as Forças Armadas da Rússia. Em outubro deste ano, o grupo afirmou que não irá recuar da região, após Rússia e Turquia anunciarem a criação de uma zona desmilitarizada na província. 

Al-Shabaab

O “Movimento do Jovem Guerreiro” (“Harakat Al-Shabaab Al-Mujahed”, mais conhecido como “Al-Shabaab”), foi fundado na Somália em 2004, por Ahmed Abdi Godane – também conhecido pelo pseudônimo Mukhtar Abu Zubair. O grupo tem orientação wahabita e defende a instauração de um Estado baseado em interpretações fundamentalistas da Sharia.

O Al-Shabaab controla territórios nas regiões sul e central da Somália. No auge de sua expansão, chegou a ocupar a capital Mogadíscio, mas foi expulso por forças governamentais em 2011. O grupo é ligado à Al Qaeda desde 2012, quando Godane anunciou aliança entre as duas organizações. O fundador do movimento foi morto em 2014. A liderança passou a Ahmad Umar.

Em 2015, um ataque do Al-Shabaab à Universidade de Garissa, no Quênia, deixou 147 mortos e 79 feridos, de acordo com o Centro Nacional de Gestão de Catástrofes (NDOC). Dois anos depois, o grupo matou cerca de 300 pessoas em Mogadíscio, capital da Somália, no que foi considerado o maior atentado terrorista da história somali.

Em janeiro deste ano, uma explosão em um hotel em Nairóbi, capital do Quênia, matou 26 pessoas e deixou 56 feridas. Ações do grupo mataram o vice-ministro do Trabalho, Saqar Ibrahim Abdallah, em março; e o prefeito da capital somali, Abdirahman Omar, em agosto. 

PKK/YPG

Fundado em 1978 por Abdullah Öcalan, o “Partido dos Trabalhadores do Curdistão” (PKK, na sigla em curdo) é uma organização política e militar que luta pela criação de um governo curdo formado por assembleias populares. Sua atuação se concentra na Turquia, mas há vertentes na Síria – sobretudo na região de Rojava, ao norte.

Inicialmente, o PKK baseava sua ideologia no marxismo ortodoxo, mas o colapso soviético em 1990 fez o Partido se reavaliar até que, em 1999, Öcalan foi preso por uma operação do serviço secreto turco no Quênia e teve contato com a obra do filósofo ecossocialista Murray Bookchin. O líder curdo formulou as bases do Confederalismo Democrático, que prega uma sociedade baseada em comunidades autônomas, socialistas, ambientalmente sustentáveis e com igualdade de gênero.

O PKK começou a agir como guerrilha em 1984. Em 2003, foi fundado o Partido da União Democrática (PYD, na sigla curda), filial do grupo na Síria. O braço armado do PYD são as Unidades de Proteção Popular (YPG), da qual fazem parte as Unidades de Proteção das Mulheres (YPJ). As YPG e as YPJ são protagonistas na luta contra o Daesh.

Em outubro deste ano, o Exército de Recep Tayyip Erdogan invadiu Rojava para expulsar os militantes das YPG. Após um acordo de cessar-fogo mediado pela Rússia, Erdogan e os combatentes curdos se acusaram mutuamente de desrespeitar as normas estabelecidas. No último sábado, a Turquia atribuiu a explosão de um carro-bomba no norte da Síria às YPG. O grupo nega a autoria. 

Exército Peshmerga

Assim como as YPG representam a luta curda na Síria, os “peshmergas” (“aqueles que desafiam a morte”, em curdo) são o braço armado desta causa no Iraque. O grupo, que atua como exército profissional, é a mais antiga organização militar da área reivindicada como Curdistão – fundada na década de 1920.

O Exército Peshmerga é suprapartidário e une diversas correntes políticas em torno da causa curda. A exemplo das YPG, a presença feminina é constante. Atualmente é liderado por Massoud Barzani, do Partido Democrático do Curdistão (PDK), que reúne de social-democratas a conservadores moderados de centro-direita. Barzani é filho de Mustafa Barzani, histórico líder nacionalista curdo.

Outra organização que compõe o Exército Peshmerga é a União Patriótica do Curdistão (PUK), de centro-esquerda. A disputa interna entre o PDK e o PUK não os impediu de formar uma coalizão política em 1992, quando ocuparam o norte do Iraque e declararam o Governo Regional do Curdistão.

Com a queda do regime de Saddam Hussein, em 2003, o Curdistão Iraquiano passou a ser uma região semiautônoma, administrada provisoriamente pelo líder do PUK, Jalal Talabani – que viria a presidir o Iraque entre 2006 e 2014. O Exército Peshmerga ganhou projeção mundial em 2015, quando seus combatentes expulsaram o Daesh da cidade de Sinjar. 

Em 2005, a primeira eleição direta para presidente do Curdistão Iraquiano deu vitória a Massoud Barzani. Ele governou até este ano, quando seu sobrinho e correligionário Nechirvan Barzani foi eleito para o cargo. 

*Nota: Por escolha editorial, a Revista Badaró não se refere ao grupo “Estado Islâmico do Iraque e da Síria” pelo nome “Estado Islâmico” ou siglas que possam dar legitimidade a ele (como “EI” e “Isis”). Não consideramos tal entidade como representante do Islamismo, nem como Estado. Por respeito à comunidade muçulmana optamos pela sigla pejorativa “Daesh”, que no idioma árabe também é um trocadilho com a palavra “dahesh” (“aquele que semeia a discórdia”).

Norberto Liberator

Editor-chefe

Jornalista, ilustrador e cartunista. Interessado em política, meio ambiente e artes. Autor da graphic novel “Diasporados”.

Fábio Faria

Diretor de arte

Estudante de jornalismo e ilustrador. Interessado em artes, cultura e assuntos do espectro político.

leopoldo neto

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Jornalista e mestrando em Comunicação. Possui interesse em jornalismo político, científico e cultural. Busca explorar o formato podcast.

MARINA DUARTE

produtora-executiva

Ilustradora, acadêmica de psicopedagogia, estudou jornalismo. Militante feminista interessada na profunda transformação social.

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